domingo, 26 de dezembro de 2010

Penélope e Dear John, ou: a guria da sala de estar

Hoje terminei de ler aquele livro do Nicholas Sparks que virou filme, Dear John - Querido John em português.



A história é meiga e previsível, fala sobre amor e sobre guerra e sobre soldados e sobre o Iraque. Mas o ponto que eu queria compartilhar não é exatamente esse.
Eu queria falar sobre o Complexo de Penélope.

Dando uma olhada superficial no google, não achei nada produtivo com esse assunto. Mas já deve existir alguma teoria acadêmica e estudade e científica sobre o assunto - que eu não conheço. Por isso tudo que escrevo aqui é só o meu achismo.

Penélope é a esposa de Ulisses nas histórias "Ilíada" e "Odisséia". É mais ou menos assim: eles se amam. Aí Ulisses é chamado pra lutar na guerra. Aí ele vai e ele luta e tenta voltar pra casa. Só que no caminho de volta muitas obstáculos e coisas ruins vão acontecendo. E a guerra foi demorada. Então Ulisses demora muito pra voltar. Enquanto isso, Penélope fica esperando por ele. Aí todo mundo acha que Ulisses morreu e obrigam Penélope a casar com outro cara. Aí ela diz que só vai casar quando terminar de costurar uma colcha pro enxoval. Só que ela ama Ulisses e acredita que ele vai voltar e está decidida a esperar por ele o quanto for necessário. Por isso - e para não levantar suspeitas - ela passa o dia costurando a tal da colcha. E a noite descosturando. Então, a colcha nunca fica pronta e ela nunca pode casar, esperando eternamente por Ulisses.

Licenças poéticas a parte, essa é mais ou menos a ideia central da história de Penélope e Ulisses. E o que eu queria comentar é essa coisa que se repete. Nós, Penélopes, queimamos sutiãs, conquistamos espaço no mercado de trabalho, independência sexual e financeira, direitos iguais, etc, etc. E, de algum jeito obscuro e patético, volta e meia nos pegamos sentadas no sofá da sala de estar descosturando colchas e esperando Ulisses voltar pra casa.

Aí eu me lembro daquela música Kriptonita de um conjunto chamado Ludov que tem um verso que é mais ou menos assim:

Enquanto eu te quiser esteja em casa, esteja na sala de estar.

E lembro também daquele outro livro da Audrey Nieffeneger que também virou filme o The Time Traveler's Wife - horrivelmente distribuído no Brasil como Te amarei para sempre.
´
Então me pego pensando que, de algum jeito  e mesmo com todas as suas particularidades, todas essas quatro "´histórias", em suas essências, são a mesma. Nós damos voltas e mais voltas, escrevemos páginas e mais páginas e sempre voltamos pro mesmo buraco central: por que diabos esperamos?

Nieffeneger indaga, logo no primeiro parágrafo de seu livro, usando Clare, sua Penélope moderna "por que a ausência intensifica o amor?"
E eu repito aqui esse questionamento, com uma fé meio embaçada de que mais alguém entenda esse monte de pensamentos vomitados aqui e consiga desenvolver algumas sentenças. Por que a ausência intensifica o amor? Quer dizer, antes disso: a ausência realmente intensifica o amor? E se sim, o inverso seria também verdade: a constante companhia o enfraquece? a rotina, o amor calmo e sem atos, a ausência de uma jornada do herói faz tudo ficar chato e cansativo?

Será que encontrar um Ulisses - ou um João - que ao invés de partir decida ficar do nosso lado enrolando novelos de lã na sala, será que isso faz ele perder o encanto? E por quê? Por quê? Será que é nossa sina, mesmo depois de todos os sutiãs e todos os anticoncepcionais, continuar olhando pro céu no primeiro dia de lua cheia esperando ele voltar? [reticências]

2 comentários:

  1. Uaaaaau!


    Vale a pena lembrar um ditado, que vai parecer bobo depois do teu texto maravilhoso: "A distância está para o amor assim como o vento está para o fogo: apaga o pequeno e aumenta o grande"

    E essa é uma questão importantíssima, a do espaço: de sentir-se dentro, à margem ou parte de uma pessoa. De se pensar e refletir e filosofar. E acreditar.

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  2. não é bobo. é lindo. e eu acho que é verdade. e se continuar filosofando a respeito, dá pra pensar que se um vento for forte demais pode apagar fogueiras maiores. talvez algumas distâncias simplesmente sejam fortes de mais. o que não tem nada a ver com km ou milhas. acho que é como tu disse, Peroni, tem a ver com "sentir".

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